Glória Novais, funcionária da Junta de Freguesia de Benfica, em Lisboa, há 33 anos, está em greve de fome em frente à Câmara de Lisboa. Acusa a Junta de Benfica de “assédio moral e laboral” e de “discriminação e humilhação”.
Glória Novais, cabo-verdiana, diz que está desde 2011, ano em que se licenciou em Gestão, a tentar progredir na Junta de Benfica, mas acusa a autarquia de tudo fazer para a impedir. “Dão-me funções cada vez mais baixas e há dez anos que não consigo exercer aquilo onde investi tempo e dinheiro para crescer na carreira. Cheguei ao meu limite. Sempre vesti a camisola, peço que reconheçam o meu valor”, desabafa ao JN.
A funcionária da Junta, que está em greve de fome como forma de protesto, trabalha no atendimento ao público no Centro Clínico da Junta de Benfica, função que não considera adequada às suas habilitações literárias.
“Quando me comunicaram que ia trabalhar para o centro clínico pensei que seria para ser gestora, mas foi para exercer funções de assistente técnico operacional. Algo que fiz há trinta anos. Foi humilhante, revolta-me e fere a minha dignidade. A Junta diz que as funções se enquadram na categoria de Técnica Superior, mas são de assistente técnica”, lamenta.
A mulher, de 59 anos, garante que, por estas e outras situações que aconteceram nos últimos anos, é alvo de “assédio moral e laboral” e “perseguição” pela Junta de Benfica. Conta ainda que entrou em mestrado em Gestão, mas só conseguiu concluir um ano, porque a autarquia lhe terá dado “uma quantidade excessiva de trabalho para não conseguir concluir este grau de ensino”.
“Vejo os outros a progredir, com as mesmas habilitações, e eu com 33 anos de casa e com as mesmas habilitações não. É discriminação. Acho uma autêntica injustiça o que me estão a fazer”, critica ainda a funcionária, que está de baixa médica desde junho por depressão.
A Junta de Benfica garante “não existir qualquer situação de discriminação ou assédio à funcionária” e diz que esta trabalha com a categoria de Técnica Superior desde 2018. “Não corresponde à verdade que as funções atribuídas à trabalhadora no Centro Clínico se reportem à categoria profissional de Assistente Técnica”.
A Junta diz ainda que “a trabalhadora está de baixa médica desde 19 de junho até 11 de outubro, data em que terá lugar uma junta médica para verificação da sua situação clínica”, mas que está apta a trabalhar. “A trabalhadora tem comparecido às consultas de medicina do trabalho, tendo sido sempre dada como apta para desempenhar as suas funções, sem qualquer restrição”.
A luta de Glória Novais já é antiga e remonta a 2006, quando, segundo a funcionária, o presidente da Junta de Benfica de então, Domingos Alves Pires, a proibiu de falar crioulo com a irmã e a insultou. “Fazia comentários racistas. Um dia confrontei-o com a situação e instaurou-me um processo disciplinar e fiquei três meses sem ordenado, acho que foi para não ter dinheiro para pagar a faculdade. Quando me inscrevi na faculdade também não queria dar-me o estatuto de trabalhadora estudante”, recorda Glória. Na altura, Domingos Alves Pires negou as acusações – à exceção da proibição de falar com a irmã em crioulo, que admitiu – ao jornal “Público”, mas, ao final de 11 anos, em 2018, Glória ganhou o processo no Tribunal Administrativo.
Sofia Cristino